A cadeia produtiva de pecuária de corte enfrenta o desafio de alcançar o equilíbrio entre viabilidade econômica, responsabilidade ambiental e aceitabilidade social para garantir a sustentabilidade da produção de carne. Isso porque a interação desses fatores já faz parte da preocupação dos consumidores mais conscientes.
Em nenhum outro momento da história as demandas sobre os produtores rurais foram tão marcantes. As forças do mercado estão diretamente questionando os sistemas de produção e todo esse processo dá origem a novos desafios e obstáculos a serem vencidos. Assim, os novos componentes que são inevitáveis dentro da produção moderna de alimentos devem ser discutidos, e não apenas pelo produtor primário, pelos processadores ou varejistas, mas sim por todos os elos da cadeia produtiva da carne.
O Pantanal é considerado Patrimônio Natural da Humanidade e Reserva da Biosfera pela Unesco. A pecuária no bioma acompanhou a colonização realizada após a exploração do ouro na Baixada Cuiabana, com a gradual ocupação das pastagens nativas da planície. Com o término do ciclo do ouro expandiu-se por toda região, há registros da atividade pecuária de 1737.
O pantaneiro foi hábil em adaptar suas práticas de manejo às peculiaridades regionais, que sempre apresentaram desafios ainda maiores em relação a outras regiões por suas características singulares. O Pantanal enfrenta dois períodos críticos de restrição alimentar: o primeiro do auge ao final da cheia (fevereiro a maio); e o segundo do meio ao fim da seca (agosto a setembro). Conforme a dinâmica das enchentes intra e plurianuais, pode haver falta de pastagem para os animais, e quando ocorrem incêndios florestais essa escassez pode ser ainda mais acentuada e levar a perda de infraestrutura com a queima de cercas e outras benfeitorias.
O Pantanal possui um rebanho estimado de 3.856.632 reses, sendo os criados à pasto com percentuais de 84,64% em pastagens nativas e 12,04% em pastagens cultivadas. O sistema é caracterizado como extensivo, com marcante especialização na fase de cria e recria de novilhas de reposição, realizada majoritariamente em pastagens nativas e com baixa taxa de lotação.
O produtor que se mantém na atividade vem adotando tecnologias mais produtivas e procura minimizar custos com melhorias contínuas nas práticas de gestão em busca de soluções para fora da porteira. Também tem sido cada vez mais constante a adoção de ferramentas modernas como o uso de genética de qualidade, nutrição e gestão, tecnologias de reprodução, cruzamento industrial, rastreabilidade, entre outras.
A diferenciação de produtos em escala comercial pode ser viabilizada por meio do associativismo, com a utilização de “protocolos de boas práticas” auditáveis, que agreguem valor ao produto por meio de selos distintivos como ‘produto orgânico’, ‘sustentável’, ‘baixo carbono’, ‘biodiversidade’, ‘garantia de origem’ e outros.
A denominação de origem é uma das tendências para o sistema de produção de carne para os próximos anos como estratégia de diferenciação. O Pantanal tem 85% de sua vegetação original conservada com 285 anos de atividade pecuária com características exclusivas relacionadas ao meio geográfico, tanto social quanto ambiental. São fatores que tornam a carne do Pantanal única, com potencial para registro de marca coletiva e obtenção de selo de Indicação Geográfica na modalidade Denominação de Origem, satisfazendo os consumidores mais exigentes e que estão em busca de experiências gastronômicas diferenciadas e conscientes.
Silvio Balduino é gerente executivo da Associação Pantaneira de Pecuária Orgânica e Sustentável (ABPO), organização associada ao GTPS. Urbano Gomes Pinto de Abreu é pesquisador da Embrapa Pantanal e pecuarista pantaneiro.
Artigo publicado originalmente na edição 184 da revista Feed&Food.