Passados 20 anos do “novo” Código Florestal (2012), infelizmente, ainda é necessário debater o “como” se regularizar ambientalmente. Isso porque o Brasil vive uma crise de inércia. De um lado, os proprietários de imóveis rurais que, em sua maioria, almejam se regularizar, mas enfrentam tantos protocolos e diversos setores de análise; do outro lado, o setor público, também querendo promover a regularização ambiental, mas com inúmeras normas, requisitos e, em caso de dúvida sobre a situação, sem respaldo seguro para decidir. Chega-se à inércia, onde as forças se anulam.
Claramente, falta diálogo. Falta consenso com os empreendimentos que estão com suas atividades em andamento e ainda se encontram com o CAR (Cadastro Ambiental Rural) pendente de análise. Falta bom senso dentro e entre os órgãos públicos para se atingir um objetivo comum, sem medo de críticas ou idealismo. Resultado: mesmo com muita boa vontade de ambos os lados, poucos processos chegam à finalização no PRA (Programa de Regularização Ambiental), que já constava na lei federal de 2012.
O PRA aparece como o reduto salvador nos órgãos ambientais e judiciais, assim como nos protocolos comerciais de pecuária e de grãos, muito bem engendrados. E quantos imóveis atingiram esse objetivo tão almejado de concluir o PRA? Quantas propriedades conseguiram compensar as suas áreas de reserva legal que podem chegar a ser até 80% da área total do imóvel?
O Brasil segue alvo de crítica da mídia internacional, com uma legislação utópica frente à sua realidade simplória, com tanto desmatamento. O maior obstáculo é ultrapassar a primeira etapa da regularização ambiental (análise do CAR). Analistas trabalham sem definições claras, com parâmetros subjetivos que, em grande parte, dependem da qualidade das imagens disponíveis e da estrutura, quase sempre precária, que os órgãos possuem para trabalhar. No final, espera-se que três a quatro funcionários sejam capazes de analisar milhares de hectares, no entanto se ocorrem dúvidas plausíveis de irregularidades ou divergências com relação à legislação vigente em apenas dois hectares, isso pode gerar até dez notificações em um mesmo CAR.
Enquanto não houver medidas enérgicas e objetivas priorizando o que realmente importa, o desmatador segue com o benefício de estar no mesmo bloco dos produtores sérios. Os assuntos podem parecer desconectados em uma primeira análise. Mas, enquanto o foco estiver no excessivo rigor normativo, milhares de campos de futebol com vegetação nativa estarão sendo derrubados. Esse desmatador prejudica diretamente a imagem do produtor e do Estado. E todos seguem irregulares.
Na cadeia da pecuária, frigoríficos utilizam inteligência artificial para analisar desmatamentos e embargos. Por que não implementar uma parceria e usar os mecanismos desenvolvidos para atendimento dos protocolos comerciais nas esferas públicas? Por que não licitar parceiros privados na análise do CAR? O monitoramento do PRA é de, no mínimo, nove anos, não seria esse tempo suficiente (e o momento adequado) para qualquer correção no CAR que venha a ser necessária?
Não é a perfeição da análise do CAR que garante que as áreas serão conservadas ou recuperadas, mas sim a consciência da legislação e, sobretudo, a certeza do reconhecimento por fazer o certo. A inteligência artificial pode analisar um CAR georreferenciado com imagem de satélite de alta resolução com a urgência que o meio ambiente clama. A inteligência humana pode ser usada para se comunicar, com palestras online, cursos ou vídeos explicativos sobre conservação ambiental. A quem interessa esse atraso?
Juliana Corrêa é Gerente Jurídica e de Sustentabilidade da AgroSB, organização associada ao GTPS.