Autor: Renato Villela
Representantes da cadeia produtiva se reuniram em São Paulo (SP) quarta-feira (18/12) na sede da MSD Saúde Animal para o 4o Fórum da Pecuária Sustentável – Perspectivas e Adaptação da Pecuária Brasileira ao Regulamento da União Europeia. Promovido pela Mesa Brasileira de Pecuária Sustentável (MBPS), o evento tinha na pauta os desafios para adequação à nova legislação europeia, a EUDR (European Union Deforestation Regulation), conhecida como lei antidesmatamento.
O lançamento do Plano Nacional de Identificação de Bovinos e Bubalinos (PNIB), feito no dia anterior pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), no entanto, roubou a cena e dominou boa parte das discussões (Ouça as opiniões de lideranças do setor sobre o plano).
O nascimento do plano, que vinha sendo gestado desde 2022, foi recebido com entusiasmo pelos dirigentes do setor. A presidente da MBPS, Ana Doralina Alves Menezes, classificou o anúncio como um “marco histórico”. “É uma grande conquista para a pecuária nacional”, disse.
Anfitrião do encontro, o executivo Delair Bolis, presidente da MSD Saúde Animal, também enalteceu o PNIB, que tem um período de oito anos (2025-2032) para ser implantado em sua totalidade. “Trata-se de uma iniciativa essencial para avançarmos na direção de uma pecuária ainda mais sustentável, produtiva e, principalmente, transparente”.
O plano de rastreabilidade anunciado pelo Mapa, vale ressaltar, tem o objetivo específico de dar garantias da segurança sanitária do rebanho bovino brasileiro, em atendimento às demandas do mercado internacional. As exigências socioambientais, por sua vez, serão atendidas pela Plataforma Agro Brasil + Sustentável. Lançada quinta-feira (18/12) pelo Mapa, a plataforma integra dados oficiais do governo e informações fornecidas pelo mercado, como certificações emitidas por instituições de avaliação de conformidade.
Cliente exigente
Aprovada em 2023, a EUDR estava prevista para entrar em vigor a partir de janeiro de 2025. O Parlamento Europeu, no entanto, aprovou no dia 14/11 o adiamento da aplicação da lei por mais 12 meses. O regulamento, que estabelece exigências rigorosas para a entrada de commodities no bloco, proíbe a importação de produtos como café, cacau e carne bovina, provenientes de áreas com desmatamento, seja legal ou ilegal, identificadas após 31 de dezembro de 2020.
“É a primeira vez que temos uma obrigação ambiental como exigência de mercado”, destacou Fernando Sampaio, diretor de Sustentabilidade da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec).
O Mapa estima que a medida afetará 15% das exportações totais brasileiras e 34% das exportações brasileiras para a União Europeia. O impacto da EUDR sobre a carne brasileira pode parecer pequeno, uma vez que a União Europeia é a quarta colocada entre importadores do produto. Das 10,45 milhões de toneladas em equivalente carcaça exportadas de janeiro a outubro deste ano, os europeus responderam por apenas 5%, num ranking liderado de longe pela da China (46%), seguido por Estados Unidos (10%) e Emirados Árabes Unidos (9%).
O mercado europeu, no entanto, é muito valorizado, pois consome cortes mais nobres e, portanto, mais caros, o que remunera melhor não apenas a indústria, mas os produtores da chamada Lista TRACES, que congrega os estabelecimentos rurais aprovados (ERAS) aptos a exportar para o bloco europeu.
Além disso, a entrada da carne brasileira nas gôndolas europeias é um atestado de qualidade do produto e de atendimento a requisitos sanitários e socioambientais, uma vez que os europeus são um dos clientes mais exigentes no cenário internacional. Nesse sentido, o atendimento à União Europeia é uma espécie de “passaporte” para outros mercados consumidores.
Agenda propositiva
Em sua apresentação, Sampaio discorreu sobre as ações a serem feitas até que a nova legislação entre em vigor, destacando o desafio do monitoramento dos fornecedores indiretos. “Estamos conversando com as certificadoras e a CNA para chegar na origem desse boi que está no ERAS, além de fazer as análises socioambientais. Temos que construir uma solução rápida para entregar a lista de fazendas para a União Europeia”, disse.
Para os dirigentes, a legislação europeia, a despeito de ter sido alvo de uma parcela dos produtores, já tem o mérito de trazer o assunto para a ordem do dia. “A EUDR pode ter tido críticas desde que foi lançada, mas todos reconhecem que serviu para acelerar as discussões sobre o tema no Brasil”, disse João Paulo Franco, coordenador de Produção Animal da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA).
A opinião é corroborada por Davi Teixeira, diretor de Negócios e Relacionamento do Serviço de Inteligência em Agronegócios (SIA), para quem as pressões internacionais têm o efeito benéfico de fazer a cadeia se movimentar. “O que estaríamos fazendo de rastreabilidade no Brasil se não fossem os cutucões?”, questionou. Para Teixeira, independentemente das ações planejadas pelo Mapa para adequação à EUDR, o setor deve ser atuante.
“Não podemos só esperar as agendas propostas, temos que propor também, pois é do nosso interesse. A Mesa Brasileira de Pecuária Sustentável tem que ser um desses atores propositivos. Se a cadeia produtiva não fizer nada, logo se passarão 12 meses e talvez estejamos aqui novamente, chorando e pedindo por uma nova prorrogação”, afirmou.
Fonte: DBO