O pesquisador Frank Mitloehner da UC Davis, no Fórum Metano na Pecuária em maio de 2022, afirma que não – desde que não haja crescimento do rebanho. Ele também reforça que há muito a ser feito para melhorar o balanço dos gases de efeito estufa (GEE), pois o metano tem um potencial 28 vezes maior que o gás carbônico (CO2) em aquecer a temperatura global, em um horizonte temporal de 100 anos. Lembrando que globalmente a agropecuária representa 12% das emissões dos GEE, enquanto a energia representa 76%¹.
Mitloehner ressalta que o objetivo final de todo esforço feito por meio da ciência das mudanças climáticas é evitar o aumento de mais de 1,5 °C da temperatura global e evitar, assim, os danos que isso acarretaria. Essa elevação ocorre com o aumento da concentração dos GEE na atmosfera, como o CO2, metano, óxido nitroso e outros GEE que são emitidos continuamente, principalmente pelas atividades humanas.
O metano ganhou destaque na COP26 de Glasgow em novembro de 2021, quando o Brasil e mais de 100 países assinaram o pacto do metano – Global Methane Pledge: uma meta global para reduzir 30% das emissões até 2030. Observemos que é uma meta global, não nacional. Fabiana Alves, diretora do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), informa que foi criado um grupo de trabalho do metano, cujo objetivo geral é propor uma agenda estratégica nacional para mitigação de metano pelo setor agropecuário.
Por que o metano?
O metano é o segundo gás mais importante dos GEE, representando 17%2 do total (em CO2eq), advindo 41%3 da agropecuária. O conhecimento das propriedades dos gases são fundamentais para que as ações de mitigação e remoção sejam eficientes. Duas características principais determinam o impacto de diferentes GEE sobre o clima: o tempo de permanência na atmosfera e a sua capacidade de absorver energia.
Vejamos o metano, que é um gás de vida curta, permanecendo aproximadamente dez anos na atmosfera. Durante este período reage quimicamente e desaparece, enquanto o CO2 permanece por mil anos na atmosfera. Podemos visualizar o metano como a água entrando numa banheira com o ralo aberto, ou seja, nunca se enchendo, desde que o volume da torneira não seja maior que a capacidade do ralo de escoar. Dessa mesma forma, o metano não aumentaria sua concentração na atmosfera, desde que o tamanho do rebanho permaneça constante.
Qual métrica é a adequada?
Para se fazer um inventário de GEE e somar os diversos GEE, foi desenvolvida uma conversão de cada gás para um período de 100 anos, sendo então expressado em CO2 equivalente, ou GWP100, amplamente utilizada. Essa métrica não tem se demonstrado ideal para todos os cenários.
Outras métricas estão sendo estudadas pelos pesquisadores Eduardo Assad da Unicamp e Mitloehner, como o GWP* (Global Warming Potencial Star). A métrica GWP* tem o objetivo de refletir melhor o impacto do metano nas mudanças climáticas ao corrigir distorções do GWP100.
A origem do gás importa?
O metano pode ser de origem biogênico ou fóssil. O metano da pecuária, que representa 20% das emissões dos GEE do Brasil, oriundo principalmente do arroto do boi, é biogênico. A fotossíntese, onde as plantas transformam o CO2 da atmosfera em celulose, feita pela vegetação consumida pelo gado é transformado em energia, alimento para o animal e metano como subproduto. Tudo isto é um ciclo, diferentemente do metano fóssil que é de via única, como podemos observar na figura abaixo.
Representação da emissão do carbono fóssil em comparação ao ciclo do carbono biogênico
Fonte: Observatório de Conhecimento e Inovação em Bioeconomia (FGV), 2020. Adaptado por Mitloehner para a apresentação Panorama das emissões de metano e implicações do uso de diferentes métricas no Fórum Metano na Pecuária, 2022.
Como reduzir as emissões do metano a curto prazo para que o pacto assinado seja alcançado?
Lembrando que as reduções das emissões, além de levarem ao cumprimento do acordo, promovem primeiramente ganhos substanciais para o pecuarista, como o aumento da produtividade e da renda. Na produtividade, o metano sozinho pode representar uma perda substancial de 2 a 12% da ingestão de energia bruta.
Alexandre Berndt, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste, demonstra diversas ações para se honrar o pacto, divididos em três pilares:
- manipulação da fermentação através de aditivos, rações e pastagens;
- aumento de eficiência de produção pelo melhoramento genético, nutrição, reprodução, sanidade, bem-estar e gestão;
- ampliação e remoção de carbono e sua compensação nos solos e através da integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Segundo Bernd, os solos são o maior sumidouro terrestre de carbono.
O pesquisador Roberto Giolo, da Embrapa Gado de Corte, demonstra que a técnica de ILPF traz muitos benefícios, além da remoção do carbono da atmosfera, como conforto térmico, melhora do valor nutritivo da forragem, melhora no desempenho reprodutivo, possibilidade de pagamento de serviços ambientais, redução da idade de abate e melhora na dieta.
Aditivos para redução de metano funcionam?
Muitos estudos sobre aditivos para redução de emissão de metano entérico já foram realizados e estão em andamento com resultados positivos, tanto do ponto de vista nutricional como ambiental.
O pesquisador Eduardo de Paula do Instituto de Zootecnia estuda os efeitos dos óleos essenciais, com o uso de técnicas de mensuração GEE elaboradas pela pesquisadora Renata Branco. Darren D. Henry pesquisador da Universidade da Georgia, investiga o uso de taninos e outros. Alguns aditivos já estão no mercado como os Taninos e Saponinas da empresa Silvateam e o Bovaer da DSM.
Redução de metano é possível!
Temos um ótimo exemplo de como a política multistakeholder implementada na Califórnia que já reduziu em 25% (ano base 2013) de suas emissões através do aproveitamento do esterco produzido nos confinamentos da pecuária leiteira, gerando biocombustíveis para uso em caminhões, carros, casas, portos, segundo o consultor Michael Boccador da West Coast Advisors.
Concluímos, então, que é necessário reduzir as emissões do metano, temos caminhos e muitos já estão sendo seguidos, porém se não houver uma ação intensa na redução do CO2, não alcançaremos a meta de manter a elevação da temperatura global no limite de 1,5 °C.
¹WRI 2019, emissões globais da agropecuária 5,79Gt em CO2eq. Disponível em: World | Total including LUCF | Greenhouse Gas (GHG) Emissions | Climate Watch (climatewatchdata.org)
2WRI 2019, emissões globais de metano 8,61Gt em CO2eq. Disponível em: World | Total including LUCF | Greenhouse Gas (GHG) Emissions | Climate Watch (climatewatchdata.org)
3WRI 2019, emissões globais de metano da agropecuária 3,49Gt em CO2eq. Disponível em: World | Total including LUCF | Greenhouse Gas (GHG) Emissions | Climate Watch (climatewatchdata.org)
Beauchemin and McGinn, 2006. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/7082581_Methane_emissions_from_beef_cattle_Effects_of_fumaric_acid_essential_oil_and_canola_oil1
Texto elaborado pela equipe técnica do GTPS, referente ao Fórum Metano na Pecuária, realizado nos dias 4 e 5 de maio em São Paulo (SP).