Em uma entrevista exclusiva concedida ao Portal de Notícias da GS1 Brasil, Luiza Bruscato, diretora executiva, e Aécio Flores, coordenador do Grupo de Trabalho de Rastreabilidade, representantes da Mesa Brasileira da Pecuária Sustentável (GTPS), compartilham não só detalhes da relevância da rastreabilidade e os desafios de implementá-la, mas também traçam um panorama da trajetória da organização, suas principais conquistas e os desafios futuros para o setor pecuário brasileiro.
Ao longo da entrevista, foram discutidas questões pertinentes, como as práticas sustentáveis no âmbito da pecuária, os principais problemas enfrentados pelo setor e as expectativas para 2023. Acompanhe os insights deste bate-papo!
Qual a história da GTPS, quando a entidade nasceu e quais são os seus propósitos?
Luiza Bruscato: O GTPS nasceu há 16 anos da reunião de diversas organizações, que perceberam a necessidade de se falar sobre o desenvolvimento da pecuária sustentável. Esse debate começou em 2007 e, logo na sequência, em 2008, tiveram os Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) da cadeia de pecuária envolvida na região da Amazônia e, em 2010, o Código Florestal Brasileiro.
Foi nesse cenário de desmatamento da Amazônia e conflitos relacionados à produção da pecuária que nasceu a organização. Ao longo desses 16 anos, desenvolvemos uma série de projetos e ferramentas para contribuir nesse avanço da sustentabilidade e ampliamos nossa atuação com foco em outros tópicos da sustentabilidade, como uso eficiente da terra, bem-estar animal, pagamento por serviços ambientais e emissões de gases de efeito estufa.
E quem faz parte do grupo?
Luiza Bruscato: Hoje, são quase 70 membros associados, dentre todos os elos da cadeia. Temos produtores rurais, empresas de insumos e serviços, frigoríficos, processadoras, varejo, restaurantes, bancos e ONGs. Entendemos que, para promover o desenvolvimento da pecuária sustentável, precisamos ter esse alinhamento de todos os setores e todo setor engajado.
Vocês mencionaram que a pecuária sustentável foi o tema principal que originou a entidade. O que estava sendo desenvolvido na época que prejudicava a boa prática na pecuária?
Luiza Bruscato: Penso que foi todo esse cenário que já comentei, mas tem a ver também com o fato de que não tínhamos uma padronização, um entendimento comum sobre o que é a pecuária sustentável. Ao longo desses anos, desenvolvemos uma ferramenta chamada GIPS (Guia de Indicadores de Pecuária Sustentável), na qual traduzimos o significado de pecuária sustentável para o Grupo.
A partir desse entendimento comum, desenhamos 35 indicadores nos quais conseguimos nos basear para ter uma fotografia do nível de sustentabilidade das atividades, gerar relatórios e apontar onde devemos colocar mais energia e esforços para resolver os problemas e avançar. Então, sempre olhando para todos os elos e considerando as múltiplas visões e perspectivas diversas, mas com o mesmo objetivo de identificar os problemas e avançar. E os problemas são identificados em cinco frentes: gestão, , meio ambiente, pilar social (trabalhadores e comunidades) e cadeia de valor (aspectos mais técnicos).
Dentro dessas cinco frentes que você citou, onde estão os principais desafios para a pecuária sustentável? Gestão, recursos humanos, meio ambiente, cadeia de valor, onde estão os maiores desafios?
Luiza Bruscato: Atualmente, temos 800 fazendas cadastradas na plataforma, e os pontos com notas mais baixas, ou seja, com desempenho menor, são as questões sociais relacionadas aos trabalhadores e a gestão. Curiosamente, o meio ambiente não é o maior desafio. No próximo mês, vamos lançar um sumário de dados da pecuária sustentável apresentando os resultados dessa ferramenta.
Quais foram as principais conquistas da Mesa Brasileira até o momento, e quais são os planos e investimentos para o futuro?
Luiza Bruscato: Acredito que as maiores conquistas estão relacionadas ao alinhamento e entendimento do setor sobre o que é a pecuária sustentável, além de consolidar a Mesa Brasileira como referência no assunto. Temos participado de eventos nacionais e internacionais, representando o Brasil e disseminando informações sobre a pecuária sustentável no país. No último ano, ocupamos espaços além das fronteiras do Brasil, debatendo questões como diligências da União Europeia e mercado internacional.
Para este ano, nosso tema central é a rastreabilidade, buscando melhorar a transparência na cadeia produtiva. Além disso, pretendemos continuar disseminando informações, oferecendo treinamentos relacionados à pecuária sustentável e trabalhando com parcerias. Também queremos avançar na assinatura de termos de compromisso relacionados ao clima e ao bem-estar animal.
Como a rastreabilidade tem ajudado nas boas práticas da pecuária e qual é a importância desse tema para vocês hoje?
Aécio Flores: A rastreabilidade é fundamental para garantir a transparência e a sustentabilidade na cadeia produtiva da pecuária. Ela permite o acompanhamento das informações sobre a origem dos animais, as práticas adotadas nas fazendas e o bem-estar dos animais, além de possibilitar o controle de questões como o desmatamento e a emissão de gases de efeito estufa.
Ela tem sido um tema de grande importância para a GTPS, e estamos trabalhando para desenvolver e implementar sistemas de rastreabilidade cada vez mais eficientes na cadeia produtiva da pecuária brasileira.
Recentemente vocês apresentaram o resultado do grupo de trabalho de rastreabilidade de 2022. Quais são os itens fundamentais para avançar no processo de rastreabilidade e como isso está relacionado à sustentabilidade na pecuária?
Aécio Flores: No grupo de trabalho de rastreabilidade, reunimos todos os atores envolvidos na cadeia produtiva da pecuária para discutir o tema. Elencamos uma série de itens fundamentais para avançar no processo de rastreabilidade no Brasil, pois consideramos a rastreabilidade tão importante quanto outros aspectos da pecuária sustentável, como manejo adequado, bem-estar animal, controle sanitário, conservação de solo, uso de água e conservação da biodiversidade.
A rastreabilidade é crucial para entender a trajetória dos animais ao longo de sua vida e criar uma radiografia sustentável de sua produção. Isso está se tornando cada vez mais importante, especialmente com as exigências dos países compradores de carne, como a União Europeia, que já anunciou que quer um produto com desmatamento zero.
Eles não querem um produto com desmatamento mais ou menos, mas sim um produto com desmatamento zero. Eles têm mecanismos de controle e de monitoramento muito avançados e estão exigindo isso de seus fornecedores. Então, a rastreabilidade se torna uma ferramenta fundamental para garantir que a produção de carne no Brasil esteja alinhada com as exigências internacionais e seja sustentável ao longo do tempo.
Você mencionou que existem grandes desafios pela frente, mas todos sabem o que precisa ser feito. Como o grupo de trabalho de rastreabilidade do GTPS planeja enfrentar esses desafios?
Aécio Flores: Sim, existem grandes desafios, mas todos os envolvidos, incluindo governo, produtores e indústria, estão cientes da necessidade de agir. O objetivo do grupo de trabalho de rastreabilidade do GTPS este ano é agrupar iniciativas em vez de criar mais uma iniciativa distinta. Queremos analisar os pontos comuns que existem entre todas as iniciativas de rastreabilidade existentes e criar uma iniciativa única, independente de quem a lidera.
É fundamental ter uma numeração e um acompanhamento específico de cada animal para comprovar sua sustentabilidade e questões sanitárias ao longo da vida.
Todos estão cientes da pressão crescente e da necessidade de agir. Agora é uma questão de ajustar o processo e trabalhar juntos para criar uma iniciativa única de rastreabilidade que garanta a sustentabilidade da pecuária brasileira e atenda às exigências internacionais.
Como você acredita que a rastreabilidade e a cooperação entre todos os elos da cadeia podem ajudar a garantir um futuro sustentável para a pecuária no Brasil e a enfrentar os desafios impostos pelos mercados internacionais?
Aécio Flores: Ao implementar a rastreabilidade e garantir a cooperação entre todos os elos da cadeia produtiva, é possível monitorar e controlar o impacto ambiental e social da pecuária ao longo de todo o processo.
Isso permite identificar e abordar questões como o desmatamento, o uso indevido de recursos naturais, as práticas trabalhistas inadequadas e outras questões ambientais e sociais. Com a rastreabilidade em vigor, é possível garantir que os animais sejam criados e manejados de forma sustentável, desde o nascimento até o abate, e que o produto final esteja de acordo com as expectativas dos mercados internacionais e dos consumidores.
Ao trabalhar em conjunto, produtores, frigoríficos, órgãos governamentais e outros atores podem compartilhar informações e recu
rsos, promovendo a adoção de práticas sustentáveis e responsáveis em todo o setor. Dessa forma, a pecuária brasileira pode se posicionar como líder em sustentabilidade e enfrentar os desafios impostos pelos mercados internacionais, garantindo assim um futuro promissor para o setor.
Quais são os dados mais desafiadores para coletar no processo de rastreabilidade?
Aécio Flores: Uma grande questão é a dos animais indiretos, pois é difícil obter informações sobre sua origem e processos pelos quais passaram.
Animais indiretos são aqueles que são comprados em uma fazenda de terminação e depois vendidos para o frigorífico. O desafio é rastrear a origem desses animais.
Quais os outros desafios na questão da governança e dos dados no contexto do agronegócio?
Luiza Bruscato: Os desafios incluem definir quem ficará responsável pelos dados e coordenará o trabalho, além de estabelecer uma governança clara em níveis federal, estadual e municipal. Há também um desafio sistêmico de entender o papel dos órgãos envolvidos e a necessidade de criar um único banco de dados.
Há ainda falta de clareza na governança, que dificulta o avanço do processo porque há muitos órgãos envolvidos e não há uma responsabilidade específica bem definida. Isso resulta em dificuldades para tomar decisões e implementar soluções eficazes.
Apoio à Sustentabilidade: A GS1 como aliada na rastreabilidade
A sustentabilidade e a rastreabilidade são fundamentais para garantir um futuro mais responsável e ético na cadeia de produção. A GS1 está comprometida em apoiar a transparência e a inovação nesse sentido. Se você deseja saber mais sobre como a GS1 pode ajudá-lo a implementar soluções eficazes de rastreabilidade e contribuir para um futuro mais sustentável, entre em contato pelo e-mail sustentabilidade@gs1br.org. Juntos, podemos fazer a diferença e criar um ambiente de negócios mais consciente e sustentável!
Fonte: GS1 Brasil