“Por que devo investir em sustentabilidade na minha produção se não terei retorno financeiro?”, pode questionar um produtor rural. Apesar do grande tráfego de informação com o advento da internet e a globalização do conhecimento, o Brasil tem como um dos principais gargalos no agronegócio a dificuldade em levar soluções e resultados de pesquisas para os quatro cantos da federação.
A pergunta realizada no parágrafo anterior ainda é a justificativa daqueles que ainda não aderiram às práticas sustentáveis em campo. Uma justificativa completamente errada – e isso é fácil de provar. Sustentabilidade é justamente o equilíbrio entre aquilo que é correto com o ambiente, com as pessoas e com o bolso.
A coordenadora Executiva do Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável (GTPS, São Paulo/SP), Beatriz Domeniconi, acredita que a crença errônea sobre a sustentabilidade tem a ver com o termo estar associado à questão da legislação ambiental. Segundo define, uma atividade sustentável é uma boa gestão de todos os seus recursos, sejam eles ambientais, humanos ou financeiros. “É aquela que tem um pasto bem manejado, evita e controla erosão, faz um bom manejo sanitário, atende às legislações, evita conversão de novas áreas, capacita sua mão-de-obra, controla seus custos e índices de produção e produtividade e, consequentemente, é rentável”, explica Domeniconi.
Sendo assim, se o produtor adotar boas práticas de manejo e produção, se trabalhar bem a gestão da atividade e se estiver adequado à legislação e demais critérios do mercado no qual está inserido, a lucratividade será uma consequência. “São raros os pecuaristas que entendem a importância de manejar os pastos como qualquer outra cultura agrícola, corrigindo e fertilizando o solo, controlando erosão etc”, lamenta a coordenadora. Além disso, ela ressalta também as restrições comerciais como um risco ao qual os produtores estão expostos quando não atendem às normas que recaem sobre o ambiente rural.
As consequências em se ignorar o bem-estar ambiental também envolvem a perda de fontes baratas de financiamentos para auxiliar na constante melhoria das propriedades para se produzir mais e melhor, com responsabilidade social e ambiental. O pesquisador de Gestão Ambiental e Recursos Naturais da Embrapa Gado de Corte (Campo Grande/MS), Rodiney Mauro, salienta também a perda de orientações sobre as melhores forrageiras ideais para determinados tipos de solos – sem essas práticas de uso e conservação do solo e da água, o produto corre o risco de perder o solo rico em nutrientes e contaminar os recursos hídricos locais e regionais.
Mauro é direto: não há desculpas. “Com o advento do Cadastro Ambiental Rural (CAR), nenhum proprietário rural pode alegar desconhecimento de práticas sustentáveis, pois todos que possuem algum passivo ambiental, como áreas degradadas, devem fazer a adequação ambiental da sua propriedade por meio do Programa de Regularização Ambiental (PRA), utilizando das novas diretrizes de bem produzir. Se não o fizer, estarão sujeitos a penalidades, diferentes daqueles que já utilizam de práticas sustentáveis em suas propriedades”, reforça.
A Embrapa é uma das grandes difusoras de conhecimento pelas propriedades rurais brasileiras. O pesquisador ressalta o projeto “Boas Práticas Agropecuárias”, para bovinos de corte, com a missão de trazer a possibilidade dos produtores se tornarem exportadores de carne para os mercados mais exigentes do planeta – que proproem práticas sustentáveis para fechar negócio. Além das tecnologias de desenvolvimento de melhores forrageiras, ele também aponta a proposta Carne Carbono Neutro (CCN), que se utiliza de integração lavoura, pecuária e florestas, para tornar o sistema produtivo de carne mais sustentável. “Essas tecnologias são grandes contribuições do Brasil no combate as mudanças climáticas globais aumentando o aporte de carbono nos sistemas de produção promovendo a sustentabilidade em geral”, conclui Rodiney Mauro.
Há algum tempo o Grupo Roncador (São Paulo/SP) vem discutindo a questão da sustentabilidade levada à sua estratégia de negócios. Com fazendas localizadas nos biomas do médio Araguaia (MT), região com riqueza em nascentes de água, fauna e flora, o grupo aplica rigoroso controle de áreas de preservação e reservas legais, bem como das condições de trabalho de seus empregados.
“Vivíamos apagando incêndios e resolvemos que isso precisava terminar! Nesse momento decidimos inserir a essa prática na estratégia do negócio e também começamos a participar da articulação com as associações do setor e parceiros para construirmos em conjunto um futuro melhor para todos”, registra o diretor de Novos Negócios e Sustentabilidade, Caio Penido Dalla Vecchia.
Para ajudar a disseminar o “mapa do ouro”, o grupo lidera o movimento “Liga do Araguaia”, formado por quatro projetos voltados à intensificação sustentável da pecuária na região. Um deles é voltado ao desenvolvimento de um modelo de intensificação, integrando fazendas de cria; outro envolve monitoramento de emissões de gases de efeito estufa em vinte e quatro fazendas correspondendo a uma área total de 89 mil hectares; o terceiro é de apoio à intensificação e regularização ambiental em parceria com a TNC, The Nature Conservancy; e há também a certificação de Boas Práticas Agropecuárias em implantação com o Imaflora.
Em aplicação em cerca de dez municípios da região, o objetivo é ajudar a comunidade a evoluir na aplicabilidade das boas práticas no dia a dia. “O pecuarista ainda é muito cético quanto ao retorno econômico da adoção dessas práticas e se mobiliza mais a partir do ‘compliance’ e de restrições impostas pelos principais compradores”, diz e completa: “Sustentabilidade tem a ver com produzir mantendo a capacidade do sistema de continuar produzindo com o passar do tempo”.
A lição final fica por conta da representante do GTPS: a lucratividade de qualquer atividade está atrelada à qualidade da gestão dos recursos envolvidos e à capacidade de acesso a diferentes mercados. Sendo assim, se o produtor adotar boas práticas de manejo e produção, se trabalhar bem a gestão e se estiver adequado à legislação e demais critérios do mercado no qual está inserido, o ganho financeiro será uma consequência.
A sustentabilidade é um dos nortes do 4º simpósio feed&food, parte integrante da programação do Salão Internacional de Avicultura e Suinocultura (Siavs 2017), realizado de 29 a 31 de agosto no Anhembi Parque em São Paulo (SP).
No dia 30 de agosto, a partir das 14h, o Palácio de Convenções Celso Furtado recebe as palestras “#Brasilalimentandomundo: o que seu negócio tem a ver com a marca agro?”, por Luma Bonvino da Revista feed&food; “O ganha-ganha da diversidade e inclusão”, por Fernando Heiderich do Instituto Meta Social; “Do campo à mesa: sustentabilidade nas cadeias de aves e suínos”, por Márcio Nappo da Seara; e “Sustentabilidade da percepção à realidade – a arte do invisível”, por José Luiz Tejon Megido.
Natália Ponse, da redação
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Fonte: Feed&Food